domingo, 13 de dezembro de 2009

A Regulamentação da Profissão de Teólogo no Brasil


Diante das divergências surgidas em relação ao projeto de lei (PLS 114/05) que regulamenta a profissão de teólogo, na audiência pública realizada nesta quarta-feira (10) pela Comissão de Assuntos Sociais (CAS), o relator da matéria, senador Paulo Paim (PT-RS), disse que não via "a mínima condição" de o projeto constar da pauta da próxima reunião da comissão, na semana que vem.


Na opinião de Paim, o tema "é explosivo" e será preciso realizar mais audiências públicas. Ele disse que tem recebido muitos e-mails de pessoas pedindo, inclusive, que a profissão não seja regulamentada e previu que a matéria só estará pronta para entrar da pauta da CAS em fevereiro ou março do próximo ano. Paim solicitou que as colaborações ao projeto sejam enviadas diretamente ao seu e-mail: paulopaim@senador.gov.br.


A presidente da CAS, senadora Rosalba Ciarlini (DEM-RN), concordou com a ampliação do debate devido à complexidade do tema e à diversidade de religiões que ainda precisam ser ouvidas.


Participaram da audiência o vice-presidente do Conselho Interconfessional para o Ensino Religioso de Goiás (Ciergo), Darcy Cordeiro; o professor da Faculdade Evangélica de Brasília Isaías Lobão Pereira Jr.; o presidente da Convenção Brasileira dos Ministros das Igrejas, Assembleias de Deus, Ministérios de Missões e Igrejas Filiadas (Cobramad), João Batista Isaquiel Ferreira; e o vice-presidente da Associação Brasileira de Pesquisa Bíblica, Valmor da Silva.


Darcy Cordeiro disse que é preciso distinguir melhor o bacharelado da licenciatura. Ele explicou que o bacharel em Teosofia está devidamente conceituado no projeto e é aquele que faz a reflexão sobre a fé e acredita na revelação cristã. No caso da licenciatura não, pois se refere ao professor de Teosofia, que é licenciado em ensino da religião, é o cientista que aborda as ciências sobre o fenômeno religioso sem vinculação a uma religião específica. O representante da Ciergo também discordou do inciso (III do Art. 1º) que incorpora os teólogos não diplomados que tenham exercido a atividade há mais de cinco anos.


Isaías Lobão, por sua vez, defendeu a permanência daquele inciso. Ele disse que os teólogos sem formação acadêmica estão na labuta diária, mas não deixam de buscar a educação formal que lhes falta. João Batista lembrou que peões de rodeio e guardadores de carros já são profissionais regulamentados e disse que a aprovação dessa lei seria o resgate de uma dívida com quem batizou, casou, aconselhou, consolou e esteve ao lado das pessoas na hora da morte. Batista pediu que o PLS tramitasse em regime de urgência.


Valmor da Silva afirmou que, por ser "amplo e confuso", o projeto de lei poderá prejudicar os teólogos em vez de beneficiar. Ele disse que, antes de regulamentar é preciso definir melhor o que é a profissão. Valmor lembrou que a licenciatura de Teologia não existe no Brasil e classificou como "problema" os cursos livres que não são regulamentados. Ele também repudiou o inciso que dispensa diploma para quem exerce a profissão há mais de cinco anos.


- Nós rejeitamos veementemente. Sem diploma, de jeito nenhum. Tem que ter preparo acadêmico - afirmou.
Ricardo Icassatti / Agência Senado
(Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)


Extraído de: www.senado.gov.br/agencia/verNoticia.aspx?codNoticia=98315&codAplicativo=2&codEditoria=3

domingo, 8 de novembro de 2009

A Religião do "Vale Tudo"


A Religião do “Vale Tudo”

O “vale tudo” é aquela modalidade de luta que permite aos lutadores praticarem numa única competição golpes que são característicos de vários tipos de artes marciais. No Brasil, por exemplo, misturam-se golpes de jiu-jitsu, boxe e muay thai. De forma geral, podemos definir o “vale tudo” como aquele tipo de luta onde praticamente não há regras e nem restrições com relação aos golpes desferidos e também onde há o contato pleno entre os lutadores.

Bem, transferindo este conceito de “vale tudo” dos ringues para o campo da fenomenologia da religião, atrevo-me a dizer que estamos vivendo dias nos quais a religião tem se valido de tal modalidade de luta a fim de poder conquistar os seus fiéis. Como diziam os antigos: “Estamos vivendo nos fins dos tempos!”.

Ora, para exemplificar o que digo, cito aqui a reportagem da revista Veja Rio (edição de 07/10/2009 - Ano 42 - Nº 40) que li dias atrás. O título da capa deste prestigiado meio de comunicação trazia o seguinte enunciado sobre as práticas de algumas igrejas católicas do Rio de Janeiro: “GUERRA SANTA - Na luta por fiéis, igrejas católicas da cidade promovem festas, sessões de exorcismo e até bênção de animais”. Ao ler esta revista de forma mais detida, me deparei com alguns fatos bastante intrigantes. Segundo a reportagem, “o leque de atrações [na Igreja Católica] se abriu: há (...) sessões de exorcismo, bênçãos de animais e festas rave embaladas por trilha sonora eclesiástica” (pp.19,20). Além disso, a reportagem ainda diz que "cachorros, gatos, papagaios e passarinhos são bem-vindos o ano inteiro [para serem benzidos pelo padre dentro da igreja!]. Tem até gente que vai à missa acompanhada do bichinho de estimação”(p.22). Porém, antes de reparar no “cisco” que está no olho do catolicismo, temos que enxergar primeiro a “trave” que está no olho do nosso evangelicalismo atual.

De uns tempos pra cá, vários segmentos da igreja evangélica brasileira têm lutado insistentemente o “vale tudo” em cima dos púlpitos, nos programas televisivos, nas rádios e também através das propagandas distribuídas em panfletos. Tudo isso tem sido feito no afã de trazer novos fiéis para dentro do aprisco do Senhor. No tatame, são dados golpes com os pés, com os joelhos, com os punhos etc. Já na esfera do sagrado, os golpes também são bem diversificados. Eis alguns deles: distribuição de rosas ungidas, sabonetes ungidos, fitas e pulseiras ungidas, sal grosso, pedra ungida e vassoura consagrada, para citar apenas alguns. Além disso, há também a reunião da troca do anjo (onde o seu anjo “fraco” pode ser substituído por outro mais forte), o tal do toque profético do shofar, a corrente das sete semanas, o tradicional copo com água abençoado (a versão “evangélica” da água benta) e tantos outros “golpes” de “vale tudo” que são praticados com o intuito de “nocautear” os novos fiéis.

É curioso observar que as regiões do corpo que são afetadas no “vale tudo” são praticamente as mesmas tanto nos ringues quanto nos púlpitos. Aliás, destes últimos são desferidos golpes principalmente:

1) contra a “cabeça” dos fiéis (por meio de uma pregação muitas vezes saturada de elementos extraídos da programação neurolinguística [PNL], que segue técnicas “Lair Ribeirianas”, técnicas de sugestionamento, verborragia positivista e outras que seguem o modelo: “suas palavras têm poder”);

2) contra o “coração” dos fiéis (através de apelos motivacionais, chantagens psicológicas, modismos etc);

3) contra o “bolso” dos fiéis (por intermédio de um culto que gira em torno de apelos financeiros, teologia da prosperidade e situações afins, nas quais é dito, por exemplo: “Deus só irá te abençoar se você der uma boa quantia de oferta”. Parafraseando aquele conhecido ditado: “templo é dinheiro!”).

Sei que devemos nos adaptar aos novos tempos em que vivemos. Todavia, esta “adaptação” jamais poderá ser confundida com o ato de fazer certas concessões com relação às verdades absolutas contidas no Evangelho de Cristo. Hoje, muitas igrejas, ao correrem atrás de suas “clientelas” e de seus “fregueses”, estão usando todos os tipos de artifícios com o objetivo de poder “fisgar” seus novos adeptos. Porém, creio que devemos ser bastante cautelosos em nossas “técnicas de conversão”, pois há uma linha muito tênue entre a “criatividade sadia” que Deus nos dá para que ganhemos almas (Pv 11.30b) e a “manipulação carnal” que é empregada por muitos “espertos” com o propósito de iludir e enganar os incautos (Mt 7.15).

Tomemos bastante cuidado, pois nessa luta de “vale tudo”, nós mesmos estamos correndo o sério risco de sermos “nocauteados” a qualquer momento.

Em Cristo,

Carlos Augusto Vailatti

O Islã - Programa Mais Você (Rede Globo) - Parte II

O Islã - Programa Mais Você (Rede Globo) - Parte I

O Judaísmo - Programa Mais Você (Rede Globo) - Parte II

O Judaísmo - Programa Mais Você (Rede Globo) - Parte I

segunda-feira, 29 de junho de 2009

E Disse Deus: "Haja Cruz". E Houve Cruz.


Esta breve reflexão tem o objetivo de nos mostrar, entre outras coisas, que foi o próprio Deus quem tomou a iniciativa no ato de redimir o ser humano de seus pecados. Esse fato é tão evidente que a Bíblia chega até mesmo a falar sobre o "Cordeiro [Jesus] que foi morto desde a fundação do mundo" (Ap 13.8). Isto é, antes que o homem existisse e, portanto, antes que pudesse praticar qualquer obra em seu favor (e até mesmo contra si próprio), Deus já havia planejado a cruz.

Aliás, é curioso observar como a cruz projeta a sua "sombra" sobre toda a Bíblia, até culminar na morte de Jesus Cristo no madeiro. Com isso, Deus estava mostrando ao homem, ao longo do tempo, de que forma Ele haveria de salvar o ser humano, ou seja, através da crucificação de Seu Filho. Dito de outra maneira, a cruz foi o jeito que Deus encontrou para poder declarar o Seu eterno amor para com toda a humanidade pecadora. O "haja cruz" pode ser notado em várias passagens do Antigo Testamento, nas quais a cruz já estava sendo prevista no pensamento de Deus.

Em Êxodo 12, no capítulo que trata sobre a instituição da Páscoa, o texto bíblico fala sobre o "cordeiro sem mácula" (v.5) que deveria ser sacrificado "à tarde" (v.6) e cujo "sangue" (v.7) deveria ser colocado nos umbrais das portas a fim de "proteger" (v.13) aqueles que estivessem dentro daquelas casas. Estes acontecimentos prefiguraram de forma admirável a morte do Cordeiro de Deus, Jesus, no Gólgota, pelos nossos pecados.

Em Êxodo (entre os capítulos 25-40), no corpo da narrativa que descreve toda a mobília que compunha o tabernáculo, vemos que a posição em que cada móvel se encontrava lembrava o contorno da cruz (basta traçar uma linha vertical imaginária, de baixo para cima, cujo "traçado" é formado pelo Altar do Holocausto, a Pia de Bronze, o Altar do Incenso e a Arca da Aliança. Tendo feito isso, imagine agora essa linha vertical sendo cruzada na horizontal por outra linha imaginária formada pelo Candelabro à esquerda e a Mesa dos Pães da Proposição à direita). Essa figura lembra os contornos geométricos da cruz!

Em Levítico, os sacrifícios expiatórios de animais também apontavam, em caráter temporário e rudimentar, para o perfeito sacrifício que seria realizado séculos depois, ou seja, o sacrifício de Cristo no Calvário.

Já em Números, vemos o relato sobre a serpente de metal que é hasteada por Moisés no deserto (Nm 21.4-9). O contexto da passagem nos fala sobre os israelitas murmuradores que foram picados por serpentes, muitos dos quais morreram. Acontece, porém, que todos aqueles que eram picados por estas serpentes venenosas e olhavam para essa serpente de metal, ficavam curados. Depois de passados mais de mil anos, o próprio Jesus, comentando esse evento, declarou o seguinte: "E, como Moisés levantou a serpente no deserto, assim importa que o Filho do homem seja levantado; Para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna" (Jo 3.14,15). Em outras palavras, Jesus comparou o hasteamento da serpente de metal no deserto com o seu próprio hasteamento na cruz!

Indo mais adiante, mais exatamente no livro dos Salmos, vemos Davi falar profeticamente sobre a crucificação de Jesus, ao dizer: "transpassaram-me as mãos e os pés" (Sl 22.16b). Detalhe: tais palavras foram ditas cerca de mil anos antes de Jesus ser conduzido à cruz!


Entrando nos livros proféticos, vemos os contornos da cruz serem fortemente delineados de forma magnífica no belíssimo texto messiânico de Isaías 52.13-53.12. E esse texto que fala, por exemplo, sobre o "cordeiro que foi levado ao matadouro" e que "não abriu a sua boca" (53.7) faz a ponte perfeita para a crucificação de Jesus tal como aparece narrada no Novo Testamento.

Nas páginas do Antigo Testamento a cruz existe na intenção salvífica e redentora de Deus. É algo que ainda não foi concretizado e, por isso, é apenas o "Haja Cruz". Porém, no Novo Testamento, o cumprimento desta intenção divina se realiza e, portanto, o resultado é: "E Houve Cruz". Conseqüentemente, houve também salvação! No Novo Testamento, o Verbo se fez carne para que, além de outros motivos, Deus pudesse principalmente se tornar "crucificável". Isso me faz pensar no maravilhoso texto de Hebreus 10.5: "Pelo que, entrando no mundo, diz: Sacrifício e oferta não quiseste, mas corpo me preparaste". Deus preparou um corpo físico para o Seu Filho, Jesus, para que este pudesse morrer na cruz pelos nossos pecados!


Nisso tudo podemos perceber como os valores de Deus são tão diferentes daquilo que os homens valorizam! Os homens, de forma individualista e materialista, dizem: "haja prosperidade", "haja prazer", "haja conforto", "haja poder", "haja diversão". Contudo, Deus, de forma altruísta, diz: "haja amor", "haja perdão", "haja reconciliação", "haja encarnação", "haja salvação" e, portanto, "Haja Cruz!". E Houve Cruz! E porque houve cruz, então hoje "temos paz com Deus, por nosso Senhor Jesus Cristo" (Rm 5.1).


Ora, Àquele que nos reconciliou consigo mesmo por meio da cruz de Seu Filho, sejam o louvor, a glória e a honra para todo o sempre!


Em Cristo,

Carlos Augusto Vailatti

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Os Tímidos não vão para o Céu?

Quando abrimos a nossa Bíblia em Apocalipse 21.8, encontramos uma declaração deveras perturbadora. O texto diz o seguinte:

"Mas, quanto aos tímidos, e aos incrédulos, e aos abomináveis, e aos homicidas, e aos fornicários, e aos feiticeiros, e aos idólatras e a todos os mentirosos, a sua parte será no lago que arde com fogo e enxofre; o que é a segunda morte".

O que eu acho surpreendente neste texto é o fato dos "tímidos" serem colocados no mesmo "pacote", juntos com os "incrédulos, abomináveis, homicidas, fornicários, feiticeiros, idólatras e mentirosos"! Aliás, os tímidos não apenas são misturados com esse tipo de gente, antes, são os primeiros a serem citados nesta terrível lista! Apenas a título de ilustração, é como se um "ladrão de galinhas" fosse preso juntamente com um serial killer da mais alta periculosidade e da pior espécie.

Diante disso, você pode se perguntar: "Por que Deus não gosta dos tímidos, uma vez que foi Ele mesmo quem criou cada ser humano com um tipo diferente de temperamento?". A esta altura, os crentes que são tímidos devem estar desesperados: "Meu Deus, mas que culpa eu tenho de ser acanhado e retraído?". Por outro lado, aqueles que são mais extrovertidos, brincalhões e expansivos devem estar se gabando: "Sempre soube que eu era o (a) preferido (a) de Deus!".

Bem, antes que os tímidos entrem em depressão e os extrovertidos se sintam a "última bolacha do pacote", devo dizer que o texto de Apocalipse não está querendo dizer nada disso. Explico: a palavra "tímidos" que aparece em Ap 21.8 vem do grego "deilois" que também pode ser traduzido como "medrosos, covardes". Mas então, o que significa dizer neste contexto que os "covardes", por exemplo, terão a sua parte "no lago de fogo e enxofre, o que é a segunda morte"?

Antes de tudo, é necessário dizer que entre os gregos da Antigüidade e, mais particularmente nas escolas filosóficas de moral, era comum a utilização de espécies de "listas de vícios" na instrução dos alunos. Tais listas forneciam uma determinada quantidade de "erros morais", os quais deveriam ser evitados por todos aqueles que quisessem seguir a prática da virtude. Ao que tudo indica, esse conceito de "listas de vícios" parece se refletir neste texto de Apocalipse.

Ora, mas por que os "tímidos", ou melhor, os "covardes" estão incluídos nesta lista? Para respondermos a esta pergunta temos que entender que o livro do Apocalipse é escrito em meio a um contexto de perseguição, dentro do qual todos aqueles que não prestassem o devido culto ao imperador romano seriam sentenciados à morte. Diante desse cenário, João faz então uma séria advertência aos cristãos covardes que, durante o tempo das perseguições, renunciavam a sua fé em Cristo com o intuito de preservarem suas vidas. Segundo o apóstolo, tais pessoas que se comportassem assim estavam sentenciadas ao "lago de fogo e enxofre".

A lição central desse texto de Apocalipse (particularmente no que se refere aos "covardes") é a seguinte: Em épocas de grande perseguição e tribulação, temos que ser corajosos na expressão da nossa fé em Cristo. Em outras palavras, não podemos ser como o "Crente-Xuxa", que, quando tudo está bem na sua vida, é só "beijinho, beijinho", mas quando tudo vai mal, ele vira as costas para Jesus e diz: "tchau, tchau!". Será que você já se deparou com pessoas desse tipo antes?

Na paz dAquele que deseja que sejamos corajosos na expressão da nossa fé,

Carlos Augusto Vailatti

domingo, 7 de junho de 2009

O Pastor Ideal. Ele Existe?


Vivemos em épocas cujos padrões de qualidade oferecidos pelas empresas seculares também têm experimentado o seu reflexo até mesmo dentro da própria Igreja. Isto significa que a busca pelo "pastor ideal", com alto padrão de qualidade, isto é, uma espécie de pastor que tenha o certificado ISO 9000, tem sido bastante grande. Porém, a pergunta que faço é: "Existe, de fato, o pastor ideal?". Bem, acredito que a resposta a esta pergunta seja um veemente: "não!".

Entretanto, não há como negar que há uma certa "insatisfação pastoral
" quase que generalizada em muitos arraiais evangélicos mundo afora, insatisfação esta que denuncia a necessidade que as ovelhas têm de encontrar um modelo de líder eclesiástico em quem possam se espelhar e depositar a sua confiança. Porém, tal "padrão de qualidade pastoral", longe de ser uma realidade alcançável, demonstra ser, pelo contrário, um ideal utópico, impossível de ser atingido. Tal fato pode ser demonstrado nas linhas que seguem:


1. Se o pastor é jovem demais, então ele é inexperiente; se já possui cabelos grisalhos, é considerado velho demais.

2. Se o pastor tem três ou quatro filhos, ele é visto como um homem relaxado, que não soube ter um "controle de natalidade" eficaz; por outro lado, se ele não tem nenhum filho, é visto como uma pessoa egoísta e que não tem a mínima autoridade para falar sobre filhos, já que ele não os tem.

3. Se o pastor chama a atenção das crianças quando fazem barulho durante o culto, ele é insensível e não gosta de crianças; se, porém, ele não chama a atenção delas, ele é um líder que não está nem aí com a ordem do culto e com as "coisas de Deus".

4. Se a esposa do pastor canta no coral, é porque ela está querendo aparecer; contudo, se ela não canta, é porque ela não tem o mínimo interesse em apoiar ao seu marido em seu ministério.

5. Se o pastor prega durante apenas meia hora, é porque ele não tem conteúdo; se ele prega durante uma hora, então é um prolixo que não tem domínio próprio sobre a sua língua.

6.Se o pastor dedica bastante tempo aos seus estudos bíblico-teológicos, ele é racional demais e também é anti-social, pois não dá a menor atenção ao rebanho; se, contudo, ele vive visitando os fiéis, é porque é um desocupado que não tem algo mais importante a fazer.

7.Se o pastor é daqueles que usam muitas ilustrações em suas pregações, ele é visto como um mero contador de histórias (uma espécie de Forrest Gump gospel), o qual não se preparou adequadamente no estudo da Bíblia; mas, se ele não utiliza ilustrações em seus sermões, estes são tidos como frios, enfadonhos e chatos.

8. Se o pastor recebe um salário "gordo", ele é um mercenário e interesseiro, pois só está no ministério por causa do dinheiro; se ele se contenta com um singelo ordenado, é porque não dá o mínimo valor ao seu ministério pastoral.

9. Se o pastor conta piadas no púlpito, ele está cometendo um sacrilégio, pois está se comportando como um mundano; se ele não usa nenhuma anedota em seus sermões, a sua mensagem é "sem graça".

10. Se o pastor cita palavras em hebraico ou em grego em suas mensagens, ele está querendo se mostrar; agora, se ele não faz nenhuma citação nestas línguas, então ele é inculto e ignorante;

11. Se o pastor costuma usar o púlpito todos os domingos para pregar, ele é egoísta e vaidoso, porque só pensa em si mesmo; já se ele cede a oportunidade para outros pregadores, é porque está se eximindo de suas próprias responsabilidades.

12. Se o pastor prega a respeito dos dízimos, ele é ambicioso e só pensa em dinheiro; se não o faz, ele está negligenciando o sagrado ensinamento sobre o dever da contribuição.

13. Se o pastor prega sobre a santificação e o arrependimento, ele está "descendo o cajado" nas pobres das ovelhas; se ele não aborda tais assuntos, é porque ele deve ter "culpa no cartório".

14. Se o pastor usa um terno diferente a cada domingo, ele é um exibicionista e um ostentador que, muitas vezes, só está se vestindo bem às custas da igreja; mas, se ele usa quase sempre a mesma indumentária, é criticado por não saber se vestir adequadamente no "dia do Senhor".

15. Se o pastor concede a oportunidade para os membros mais abastados da igreja desempenharem o serviço cristão, é porque ele está de olho no dízimo deles; se, entretanto, ele concede tal oportunidade aos mais pobres, ele está querendo fazer o seu marketing pessoal espiritual.

16. Se o pastor vive telefonando para as suas ovelhas durante a semana, é porque ele "não dá um tempo" e só se preocupa em "sufocar" e "policiar" a vida dos seus arrebanhados; todavia, se ele não liga pra ninguém, é porque ele não está nem aí com a situação espiritual das ovelhas.

17. Se o pastor trabalha na igreja full time (por tempo integral), ele é um sujeito aproveitador que, por não ter conseguido um "trabalho melhor", só quer saber de "sair no lucro" de forma fácil; por outro lado, se ele trabalha meio período na igreja e meio período em um serviço secular, é porque ele não dá a mínima importância para a "obra do Senhor", pois a está fazendo de "qualquer maneira".

18. Se o pastor "dirige o culto" de domingo de maneira que este termine mais tarde, ele é desorganizado e relapso, pois não está preocupado com o fato de que os irmãos terão que levantar cedo na segunda-feira para trabalhar; mas, se o culto termina no horário ou mais cedo do que o previsto, ele não é "espiritual, o bastante" para deixar o culto "fluir" no Espírito.


Ora, diante destes e de muitos outros exemplos que poderiam ser citados, chego à seguinte conclusão: "SER PASTOR É MUITO DIFÍCIL!". E toda esta dificuldade se deve, em parte, ao fato de que muitos membros projetam em seus pastores a figura utópica do líder ideal (ou "Super Líder"), o qual tem a responsabilidade de ser sempre: o melhor pregador, o melhor teólogo, o melhor companheiro, o melhor administrador do culto, o melhor pai, o melhor marido, o melhor amigo, o melhor conselheiro etc. Detalhe: Todos esses bons predicados têm que coexistirem sempre ao mesmo tempo no pastor, sem exceção! E ai dele se não for perfeito em tudo!

Porém, a essa altura da nossa reflexão, creio que seja importante deixar registrado aqui dois recados: um para os pastores e outro para as ovelhas.

Primeiramente, me dirijo aos pastores. Caro pastor, não tenha a pretensão de agradar a todas as ovelhas em seu ministério, pois isso jamais acontecerá. Sempre haverá pessoas insatisfeitas com o culto, com a mensagem, com o louvor e até mesmo com você! Porém, não se deixe desanimar diante disso. Aliás, não use isso como justificativa para não oferecer o seu melhor a Deus e à Sua Igreja. Se Deus o vocacionou ao pastorado, vá em frente! Busque dar aquilo você tem de melhor no ministério e creia que o Senhor o abençoará.

Agora, falo às ovelhas. Nobres ovelhas do aprisco do Senhor, tomem cuidado para não exigirem demais de seus pastores. Não se esqueçam que eles não são "super homens". Pelo contrário, são tão humanos quanto vocês. Eles também enfrentam diariamente os mesmos problemas e as mesmas dificuldades que vocês enfrentam. Além disso, não exijam demais da esposa do pastor e do(s) filho(s) do pastor, impondo-lhes um nível de "santidade" e de "comportamento exemplar" que nem mesmo vocês ou seus filhos conseguem desempenhar. Respeite o seu pastor e ore muito por ele, pois, assim como você, ele também precisa de muito apoio, de muita compreensão e, acima de tudo, de muita oração.

Bem, acredito que ao término desse nosso pensamento duas coisas tenham ficado bem claras: assim como não há o pastor ideal, também não há a ovelha ideal. A Igreja de Cristo é composta por pastores e ovelhas imperfeitos, falhos e pecadores. Todavia, tanto um como o outro buscam almejar para as suas vidas o exemplo de perfeição que o Sumo Pastor, Jesus Cristo, lhes inspira.

Ora, Àquele que é o Único Pastor Ideal, o Sumo Pastor das nossas almas, sejam o louvor e a majestade para todo o sempre!

Em Cristo,

Autor:
Carlos Augusto Vailatti

sábado, 6 de junho de 2009

De que Planeta Você é?


Às vezes, em nome da santidade e da boa conduta “cristãs”, somos ensinados a não nos misturarmos com “as coisas do mundo”. Tal discurso alienador encontra na máxima cristã: “Não somos desse mundo” a sua mais forte aliada. Aprendemos, muitas vezes, que não devemos ouvir “músicas do mundo”, nem ler “livros do mundo”, nem tão pouco nos divertir com “diversões do mundo”, ou assistir a “filmes do mundo”, pois todos estes elementos mundanos são profanos e, portanto, podem “contaminar” a nossa fé e vida cristãs.

Porém, é curioso notar que o apóstolo Paulo, por exemplo, e em certo sentido, parece ir na contramão de todo este “sistema alienante” que se diz ser cristão. Sabe-se que o apóstolo Paulo, várias vezes, menciona ditos ou pensamentos pagãos (ou “mundanos”, se preferir) em suas epístolas. No seu famoso discurso feito no Areópago de Atenas, por exemplo, Paulo cita em Atos 17.28b uma passagem do poeta grego Arato (315/310-240 a.C.)[1], a qual também ocorre na oração que Cleantes (331/330-225/220 a.C.)[2] dirige ao deus romano Júpiter, em seu Hino a Júpiter: “Pois somos também sua geração”. Além disso, o apóstolo cita o filósofo, poeta e místico cretense Epimênides (c.600 a.C.),[3] quando diz em Atos 17.28a: “Nele vivemos, e nos movemos e existimos”. Em 1 Coríntios 12.14-26, ao falar sobre a importância dos vários membros do corpo comparando-os ao Corpo de Cristo, a Igreja, Paulo utiliza uma comparação que já é bem conhecida naquela época. O apóstolo parece tirar o seu discurso da Fábula da Rebelião dos Membros contra o Estômago, a qual foi utilizada pelo cônsul romano Menênio Agripa (VI século a.C.) em um discurso político.[4] Já em 1 Coríntios 15.32b, Paulo menciona duas sentenças do poeta grego Menandro (c.342-291 a.C.): “Comamos e bebamos, porque amanhã morreremos”[5], bem como, menciona em 1 Coríntios 15.33 um conhecido provérbio popular: “as más conversações corrompem os bons costumes”. Em Tito 1.12, Paulo novamente recorre ao já citado poeta cretense Epimênides (a quem ele chama de “profeta”!), a fim de caracterizar o gênio dos habitantes de Creta: “Os cretenses são sempre mentirosos, bestas ruins, ventres preguiçosos”.[6] Esses poucos, mas importantes exemplos, servem para nos mostrar que Paulo também usou fontes profanas (“mundanas”) em seus escritos.

A constatação desse fato me leva a pensar na nossa tamanha “hipocrisia cristã” contemporânea. Explico: Dizemos que não podemos ouvir “músicas do mundo”, como, por exemplo, Como é Grande o meu Amor por Você, de Roberto Carlos, mas podemos nos consultar e inclusive fazer cirurgias com “médicos do mundo”, isto é, não-cristãos (é claro, como cuidar da saúde é o mais importante, então, não importa a fé do médico que me atende, desde que ele me ajude a ficar curado!). Dizemos, muitas vezes, que não podemos nos divertir com certas “diversões do mundo”, tais como: teatros, cinemas, parques de diversão, festas juninas etc, mas não estamos nem um pouco preocupados com a fé do juiz que irá julgar um eventual processo nosso que esteja na Justiça (desde que a justiça seja feita, pouco nos importa qual é o “sistema de crenças” desse juiz!). Declaramos que não podemos ler certas “literaturas do mundo”, como A Origem das Espécies, de Charles Darwin, mas ficamos com a nossa consciência tranqüila quando, por exemplo, um mecânico, pedreiro, policial, engenheiro ou qualquer outro “profissional do mundo” nos ajuda a resolver os nossos problemas.

Ora, para ser bastante franco, creio que seja momento de voltarmos a refletir sobre uma das doutrinas teológicas mais importantes das Igrejas Reformadas, ou seja, a doutrina da “Graça Comum”. A Graça Comum é aquela graça que é estendida a todas as pessoas através da providência geral de Deus como, por exemplo, sua provisão do brilho do sol ou da chuva que é para todos.[7]

É a Graça Comum que permite a um não-cristão ser um bom pai, um excelente profissional, um criativo compositor, um inteligente advogado etc, independentemente da fé que ele professa! Sendo assim, temos que tomar bastante cuidado para não vivermos alienados do mundo e da realidade que nos cerca, bem como, temos que tomar cuidado para não demonizarmos tudo aquilo que tachamos de “mundano” e “profano”. Temos que parar com essa “Síndrome de Crente ET” (“Não sou deste mundo”) e entendermos, de uma vez por todas, que ao interceder por nós há quase dois mil anos atrás, Jesus orou assim ao Pai: “Não peço que os tires do mundo, mas que os livres do mal” (Jo 17.15). É claro que não estou querendo dizer com isso que devamos aceitar tudo aquilo que o mundo nos oferece. Nada disso! Tudo aquilo que se constitui em pecado sempre continuará a ser pecado diante de Deus e, portanto, deverá ser evitado por nós. Porém, não podemos continuar a ser hipócritas, vendo ou não vendo “pecado” apenas naquelas situações que nos são convenientes. Há que se entender que em meio a toda a humanidade (e isso inclui os não-cristãos) nós podemos encontrar exemplos de pensamentos e comportamentos corretos e verdadeiros e que, sendo assim, são dignos de serem apreciados e até mesmo imitados. Dito de outra forma, temos que aprender a aceitar o fato de que também há beleza, inteligência e outros inúmeros rastros de Deus “fora das paredes da Igreja”. Infelizmente, porém, há muitos crentes que insistem em viver uma vida alienada, como se tivessem sido abduzidos por alguma nave extraterrestre para alguma galáxia distante. Algumas pessoas parecem se comportar como se fossem habitantes de Saturno, Mercúrio, ou até mesmo, habitantes do lendário planeta Naboo, de Star Wars II. Tudo isso parece ser muito engraçado, mas, na verdade, é muito triste de se ver.

Diante disso tudo, é necessário perguntar: “de que planeta você é?”. Bem, se você é do planeta Terra (e eu desconfio que seja), então é importante refletirmos sobre a maneira pela qual temos enxergado o nosso mundo. Em outras palavras, a nossa cosmovisão cristã não pode continuar sendo excludente, alienante, preconceituosa e, sobretudo, demonizadora, quando o objeto de nossas reflexões é o mundo em que vivemos e a realidade existencial que nos rodeia.

Ora, ao Deus do Universo sejam a glória e o louvor para sempre!

Em Cristo,

Autor: Carlos Augusto Vailatti


[1] JOHNSON, Luke Timothy. The Acts of the Apostles. Collegeville, The Liturgical Press, 1992, p.316.

[2] GRAY, James Comper & ADAMS, George M. Gray and Adams Bible Commentary.Vol.IV. [Matthew – Acts]. Grand Rapids, Zondervan Publishing House, S.d., p.663, note h.

[3] JOHNSON, Luke Timothy. Op.Cit., p.316.

[4] Cf. LÍVIO, Tito. Ab Urbe Condita Libri. [História de Roma]. Vol.I. São Paulo, Editora Paumape S.A., 1989, pp. 149,150.

[5] ROHDEN, Huberto. Paulo de Tarso. São Paulo, Martin Claret Editores Ltda, 1999, p.88.

[6] KELLY, J. N. D. Epístolas Pastorais, introdução e comentário. São Paulo, Vida Nova/Mundo Cristão, 1991, p.213.

[7] ERICKSON, Millard J. Conciso Dicionário de Teologia Cristã. Rio de Janeiro, Juerp, 1995, p.75.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

Teologia Prática para Crianças


Talvez você ainda não tenha parado para pensar num fato bastante comum de nosso dia-a-dia, mas que, via de regra, acaba passando desapercebido diante de nossos olhares desatentos. E o fato é: desde cedo, sem que o saibam na maioria das vezes, os pais matriculam suas crianças num curso de teologia prática intensiva. Esta informação, a princípio, pode soar estranha, mas é a mais pura verdade. Senão, veja só. Quando um pai diz ao seu filho, por exemplo: "Filho, se você não comer toda a comida o Papai do céu vai ficar zangado com você", ou então: "Filha, se você não fizer a lição de casa, o Papai do céu irá te castigar", o pai está, em última análise, ensinando teologia para a criança. Ou melhor, está ensinando uma teologia onde a imagem de Deus é grandemente distorcida e desvirtuada. Em outras palavras, é como se o pai lhe dissesse: "Filho (a), Deus é um Pai chato, ranzinza, carrasco e severo, que vive sempre à nossa espreita procurando alguma falha, a fim de poder nos punir".

Por outro lado, sempre que a criança apronta algo e os seus pais lhe "repreendem" num tom paradoxalmente simpático de aprovação, dizendo: "Filho (a), vê se fica quieto (a)! Você parece um (a) capetinha!", tal frase pode representar na mentalidade ainda em formação da criança o seguinte: "Filho (a), o capeta (diabo) é arteiro, brincalhão e bagunceiro". Dito de outra maneira: "O capeta não é tão ruim como o pintam. Ele até que é um sujeito bem legal!". Além disso, de acordo com estudos psicológicos, sabe-se que a criança tende a ver o lado paterno de Deus (Deus como Pai) através da lente comportamental de seu pai biológico. Isto significa dizer, por exemplo, que se um pai vive maltratando o seu filho (por meio de xingamentos, falta de atenção, espancamentos e outros comportamentos reprováveis), a tendência da criança será transferir este aspecto relacional negativo experimentado com o seu pai biológico para a figura teológica de Deus como Pai. Tal fato poderá desencadear na criança um bloqueio na sua relação filial com Deus, fazendo-a sentir sérias dificuldades psicológicas em aceitar a Deus como Pai amoroso, compassivo e carinhoso. A partir dessas considerações, urge fazermos as seguintes perguntas: "Como é que nós, pais, nos relacionamos com os nossos filhos?". E ainda: "Que imagem paterna de Deus, estamos ajudando a formar em nossos (as) filhos (as), a partir da nossa relação cotidiana com eles?".

Ora, diante deste preocupante quadro que é desenhado, penso que caiba a cada pai reavaliar a sua postura comportamental para com o seu filho (a), bem como, se auto-questionar sobre a qualidade do papel paterno que ele tem desempenhado no contexto doméstico e fora dele. Que os pais continuarão a ensinar teologia aos seus infantes, isso está bem claro. Porém, a pergunta que se faz necessário responder é: "que tipo de teologia prática os pais continuarão a ensinar aos seus filhos?". Dependendo da resposta dada a esta questão, poderemos estar preparando para o futuro dois tipos de pessoas adultas: aqueles (as) que terão prazer em chamar a Deus de "Abba" (paizinho), pois se vêem a si mesmos (as) naturalmente como "filhos (as) de Deus", ou aqueles (as) que apenas O conhecerão como "Senhor", porque se enxergam unicamente como "servos (as) de Deus", e não como filhos (as).

Na paz de Cristo,

Carlos Augusto Vailatti

sexta-feira, 22 de maio de 2009

A Conspiração Bonsai: Reflexões


Introdução

Ao ler o livro: “A Conspiração Bonsai” de Paul Anderson-Walsh, São Paulo, Grapho Editores, 2006, confesso que me senti impactado por alguns pensamentos que encontrei nesta obra. Abaixo, destaco apenas alguns insights do autor, os quais foram extraídos dos primeiros seis capítulos de seu livro. Acredito que alguns trechos dessa obra nos farão refletir bastante sobre o legalismo hoje presente em muitas de nossas igrejas:

I – Textos Selecionados do Livro:

No prefácio da obra, Steve McVey faz as seguintes declarações sobre Walsh: “Paul Anderson-Walsh é tanto um amigo como um profeta para a igreja moderna. Um amigo, pois seu coração anseia em ver os que seguem a Cristo livres das cadeias do legalismo religioso, que impede as pessoas de alcançarem seu potencial pleno. Um profeta porque ama a igreja a tal ponto de declarar, com ousadia, a verdade que abre as portas para a liberdade, mesmo quando esta fundamenta-se em forte contradição às falsas tradições que muitos adotaram, erroneamente como doutrina”. (p.15) Depois disso, McVey complementa: “Por muito tempo buscou-se um crescimento que estava confinado num vaso religioso, impedindo o aprofundamento de nossas raízes espirituais. Temos permitido que os ramos de nossa vida espiritual sejam podados por ministrações manipuladoras, deixando-nos com a aparência normal, onde na realidade fomos minimizados e atrofiados de nosso crescimento”. (p.15)

Após estas considerações preliminares, Walsh define Bonsai como: “a técnica e ou arte, originária do Japão, de miniaturizar plantas (geralmente árvores ou arbustos), através de métodos específicos que visam manter suas características normais de proporção e morfologia”. (p.19)

Em seguida, o autor afirma que “a forma de religião que a maioria dos cristãos adota é a escravidão, não a liberdade” (p.24).

Ao falar sobre o bonsai, Walsh comenta que “as árvores ou arbustos em questão são manipulados de forma a serem minimizados, nanicos. Ao invés de crescerem até atingir seu tamanho potencial, seu crescimento é impedido e interrompido. Interessantemente, isso é alcançado nutrindo-os em vasos rasos e sujeitando-os a podas seletivas” (p.29).

Ao dar continuidade ao seu pensamento, o autor, comparando o Bonsai ao Ser Humano, declara: “Fico intrigado pelo paralelo entre o bonsai e o problema, muitas vezes ignorado, do ser humano. Parece-me que nós também estamos sujeitos a uma forma semelhante de manipulação. Não só fomos plantados em vasos rasos, nos quais é impossível que nossas raízes cresçam e se aprofundem até o solo rico e doador de vida; pior, o solo está contaminado. Além disto, nosso crescimento está comprometido pela ‘poda’ da Vida de Deus, cujo fluxo é impedido de alcançar nossos galhos devido às tesouras dos ‘deves’ do que os cristãos intitulam ‘legalismo’ e que Freud chama de alienação religiosa”. (p.29).

Walsh completa e amplia a sua argumentação, dizendo: “na verdade, toda a raça humana tem sido restringida. Quer seja através de contratos religiosos ou sociais, desenvolvemos roteiros mentais que nos condicionam”. (pp.29,30).

Mais adiante, o autor irá declarar: “Parece que o Homem prefere as algemas à liberdade. Na verdade, somos completamente institucionalizados”. (p.57).

Ao comentar sobre o pensamento que inspirou o nome de seu livro, Walsh expõe então a sua tese: “Sugiro que há uma conspiração. Isso se dá no cerne do que eu chamo de ‘Conspiração Bonsai’. Sugiro que, sem que saibamos, fomos neutralizados para evitar que cresçamos. Por que, você pergunta, alguém permitiria ser restrito dessa forma? Bem, na verdade, a maioria, senão todos nós, não percebemos que nosso crescimento foi limitado. Há muitos vasos limitadores, inúmeros. (...) chamamos a atenção para um em particular – esforço próprio – o bonsai do auto-melhoramento, visto pelo paradigma da ‘igreja’. (...) veremos que esse vaso em particular é a ‘igreja’, mas pode ser sua carreira, sua comunidade, seus pertences ou qualquer outro paradigma em que você tenta achar significado e propósito para a vida separada da Vida de Cristo em você”. (pp.59,60).

Por fim, ao discorrer sobre o posicionamento de Paulo frente ao legalismo encontrado nas Igrejas da Galácia, Walsh pondera: “A preocupação perene do apóstolo Paulo era desviar a correnteza de Legalismo que ameaçava inundar a Galácia. (...) Em Gálatas eram os legalistas. A abordagem dos legalistas era sorrateira. Ao invés de buscar abater o princípio de justificação pela fé, insistiam que este era apenas o começo e que ele deveria ser completo ou aperfeiçoado através da santificação pelas obras. Na época, a questão era a circuncisão. Hoje pode ser o batismo, jejum, oração, freqüência à igreja, dízimo ou qualquer outra forma de Lei”. (pp.102,103).

II – Formas de Promover o “Legalismo” e as “Tradições de Homens” no Seio da Igreja:

Estes pensamentos mencionados por Paul Anderson-Walsh em seu livro, me levaram a uma série de reflexões nos dias atuais:

Há muitas “tesouras”, aliás, muito afiadas, as quais buscam “podar” o povo de Deus nos dias de hoje. Estas “tesouras” cujas duas lâminas podem ser chamadas de “legalismo” e “tradições humanas” são traduzidas em termos de “você deve (pode) fazer isso/não deve (não pode) fazer aquilo”. Tais instrumentos manipuladores têm estado cada vez mais presentes em nosso contexto eclesiástico de uns tempos para cá. Abaixo, cito apenas alguns legalismos e tradições humanas que têm “podado” a Igreja de Cristo:

- Você, membro da “igreja x”, não pode visitar a “igreja y” (essa postura não é nem um pouco fraterna, além do que, demonstra a total suspeita que o pastor tem de sua ovelha);

- Você deve ser batizado no Espírito Santo (i.e., tem que “falar em línguas”) obrigatoriamente, se quiser ser pastor, caso contrário, não será aceito ao pastorado (esse absurdo já aconteceu comigo!);

- Você, mulher de Deus, não deve usar “batom”, “brincos”, “calça comprida” e “penteados vaidosos”, pois todas estas coisas são do diabo (então o diabo é fashion!);

- Você não deve assistir à televisão, pois ela é um instrumento de Satanás (de novo, a culpa é do diabo!);

- Você deve participar de todos os cultos da campanha das sete semanas de libertação, pois, caso contrário, a sua libertação não será completa (já pensou se Jesus fizesse tal exigência como condição para se obter a libertação em Sua época?!);

- Você deve orar três vezes ao dia, senão Deus não ouvirá a sua oração (ou seja, o que vale é o esforço humano e não a graça divina);

- Você deve falar repetidamente “glória, glória, glória, glória, glória, glória, glória, glória, glória (ad infinitum)” se quiser ser “batizado (a) no Espírito Santo” (esta “doutrina” deve ter sido extraída do livro de “2º o Homem, capítulo 6, verso 66”);

- Você deve dar uma contribuição generosa, se quiser que Deus abençoe a sua vida financeira (isto é, Deus é tão interesseiro quanto você – segundo aqueles que ensinam tal aberração);

- Você não deve conviver com as pessoas do mundo (não-cristãs), pois elas farão você se desviar da fé (pois é, João 17.15 está na Bíblia de enfeite);

- Você deve obedecer ao seu pastor/líder eclesiástico sempre, ainda que ele esteja errado. Caso contrário, você está em rebeldia (muito conveniente, não?!);

- Você não deve questionar jamais a doutrina ensinada na sua igreja (ainda que ela esteja equivocada), pois ela foi inspirada pelo Espírito Santo (é muito fácil usar o nome do Espírito Santo em vão para querer legitimar as nossas ações);

- Você deve orar no monte de vez em quando, se quiser receber mais unção de Deus para a sua vida espiritual (por que tem que ser no monte?);

- Você não deve aceitar este problema na sua vida, pois ele não vem de Deus (já pensou se Jesus usasse esse argumento para não ter que ser crucificado?!);

- Você não deve aceitar a pobreza na sua vida, porque, afinal de contas, você é filho (a) dAquele que é o dono do ouro e da prata (por favor, vá ensinar essa “doutrina” lá na África, no Gabão, na Etiópia etc, e veja como é que as pessoas reagirão a isso);

- Você, que é “pentecostal”, não pode participar de cultos nas igrejas chamadas “tradicionais”, porque essas igrejas são frias (é, tem crentes que são tão “espirituais” que não podem se misturar com outros crentes!);

- Você, que é “tradicional”, não pode participar de cultos nas igrejas “pentecostais”, porque os crentes dessas igrejas são desequilibrados (isso não é verdade, pois há muitos crentes pentecostais que experimentam, de fato, a presença de Deus em suas vidas de forma legítima);

- Você deve ser rebatizado se quiser ser membro dessa igreja, pois o seu batismo anterior não tem nenhum valor aqui (então, Efésios 4.5 serve para quê?!);

- Você, jovem, deve namorar no máximo 6 meses/1 ano antes de se casar. Se passar desse prazo, seu namoro não receberá mais a bênção “de Deus” e “da igreja” (isso é terrorismo puro!);

- Você, mulher de Deus, não deve usar anti-concepcional ou qualquer outro método contraceptivo. Tais procedimentos não agradam a Deus (bom, se a igreja “bancar” fraldas, creche, educação, roupas, remédios e demais gastos dos seus filhos (as), então está tudo bem);

- Você, obreiro, não deve faltar a nenhum dos cultos, pois, se desobedecer a este regulamento da igreja, ficará afastado (“no banco”) durante três meses (desse jeito o fiel ficará longe da igreja para sempre!);

- Você, que cometeu algum pecado nestes dias, não pode participar da Ceia do Senhor (se é assim, então nos cultos de ceia as igrejas ficarão vazias!).

Conclusão

Bem, estes são apenas alguns poucos exemplos de “legalismos” e “tradições humanas” que, por mais incrível que possa parecer, estão bem presentes em várias igrejas por aí. Tais “ordenanças” e proibições, entre tantas outras que poderíamos mencionar, visam, muitas vezes, manipular os fiéis e “podá-los” de sua liberdade que outrora foi conquistada em Cristo. Além disso, estes preceitos de homens, assim como o vaso raso do bonsai, não permitem que as nossas raízes se aprofundem na terra fértil da nossa relação com Deus. Todo este legalismo miniaturiza cada vez mais a nossa identidade cristã, funcionando como uma espécie de regime escravocrata o qual algema a nossa liberdade em Cristo e nos reduz à estatura de nanicos espirituais. É verdade que a Bíblia nos compara muitas vezes a árvores (por exemplo, Salmo 1.1-3; 90.12; João 15 etc), porém somos comparados a árvores grandes, frondosas e frutíferas e não a árvores anãs, limitadas e sem raízes profundas. Que Deus nos livre dessas igrejas que nos tornam reféns de regras e que, ao mesmo tempo, Ele nos ajude a desfrutar da total liberdade (com responsabilidade, é claro!) que um dia nos foi dada em Cristo Jesus!

Àquele que nos libertou para que fôssemos verdadeiramente livres, seja a honra e a glória para todo o sempre!

Autor: Carlos Augusto Vailatti